Intolerância contra refugiados, diga não a essa violência!

Xenofobia, nunca esse termo foi tão usado no Brasil e no mundo como atualmente. Xenofobia, que é uma palavra de origem grega formada pelas palavras “xénos” (estrangeiro) e “phóbos” (medo), significa aversão a pessoas ou coisas estrangeiras. Pode se caracterizar como uma forma de preconceito ou como uma doença, um transtorno psiquiátrico.

No Brasil, xenofobia é crime tipificado na lei 9.459, de 1997, que em seu artigo 1.º diz: “serão punidos, na forma desta lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”. Com isso, a intolerância contra refugiados torna-se crime.

O Brasil assinou os principais tratados internacionais de direitos humanos e faz parte da Convenção das Nações Unidas de 1951 sobre o Estatuto dos Refugiados e do seu Protocolo de 1967.

O problema dos refugiados tornou-se uma crise mundial, um drama, ficando impossível fechar os olhos para isso. Dados da Acnur, órgão da ONU para refugiados, mostram que a cada 01 minuto, 24 pessoas são forçadas a abandonar suas casas, trabalhos, famílias e países na tentativa de sobreviver aos horrores e às perseguições relacionadas à violação grave de direitos humanos por conflitos armados, questões de nacionalidade, raça, opinião política ou pertencimento a grupo social.

Fazendo uma conta rápida: 24 pessoas por minuto equivalem a 1.440 por hora, e a 34.560 por dia, que procuram outros países para renovarem suas esperanças.

Eu sempre tive a ideia, e julgo que a maioria dos brasileiros também, de que o Brasil é um país hospitaleiro que recebe de braços abertos os estrangeiros e imigrantes, mas, não é bem assim.

Com a crise mundial, a quantidade de refugiados chegando ao Brasil cresceu muito, consequentemente, fez crescer a xenofobia.

Ao defender uma tese de doutorado na UFRJ, o pesquisador Gustavo Barreto analisou mais de 11 mil edições de jornais e revistas brasileiros no período de 1808 até 2015. A conclusão é que a discriminação contra o imigrante perdurou por todo esse tempo. Barreto destaca que o imigrante, ou seja, aquele que vem morar em nosso país, sempre foi tratado como um problema, uma questão a ser resolvida. Porém, o estrangeiro, aqueles que moram em outros países e só vêm a turismo, é visto sempre como positivo, muitas vezes melhor que o brasileiro.

Em 2015 houve um aumento de 633% nos casos registrados de xenofobia em relação a 2014. Trezentos e trinta casos registrados pela Secretaria Especial de Direitos Humanos, pela plataforma “Disque 100”, e 269 registrados pelo Humaniza Redes, que recebe denúncias “online”. Em 2014 foram 45 casos registrados.

Contudo, a xenofobia é um crime quase invisível para o judiciário, menos de 1% dos casos chegam à justiça. O Huff Post Brasil fez um levantamento nos 26 judiciários estaduais e no Distrito Federal e identificou apenas 03 casos: um em São Paulo, outro no Rio Grande do Sul e um na Paraíba. As três causas já foram julgadas em primeira instância, e nenhum dos réus foi condenado.

Alguns casos de extrema xenofobia foram relatados recentemente, por exemplo:

A imagem chocante de um ambulante agredindo verbalmente e hostilizando o sírio Mohamed Ali, que vendia salgados árabes nas ruas de Copacabana, Zona Sul do Rio de Janeiro, com pedaços de pau nas mãos e gritando: “Sai do meu país! Nosso país tá sendo invadido por esses homens bombas, que matam crianças”, expõe a xenofobia existente no Brasil.

Seis haitianos foram atingidos por tiros de chumbinho no bairro Glicério, em São Paulo, em agosto de 2015. Junto com os disparos ouviu-se: “Haitianos, vocês roubam os nossos empregos”. Se não bastasse, tiveram dificuldades em encontrar um hospital para retirada das balas, só conseguindo 17 dias depois, já com os ferimentos infeccionados.

Em Porto Alegre um casal de peruanos foi impedido pela síndica de utilizar o salão de festas, e depois impedido de usar outros benefícios do prédio. Eles e seus filhos foram alvos de xingamentos.

Em Curitiba um congolês, formado em engenharia e falando bem o português, fez mais de 30 entrevistas de emprego. Em uma dessas a entrevistadora disse que não precisavam de estrangeiros e africanos. “Eu fiquei chocado quando ouvi. Sempre achei que o Brasil era um país de pessoas felizes, mas aqui só encontrei tristeza”, disse ele. Em uma entrevista para uma vaga de atendente no McDonald’s, afirma ele: “A entrevistadora gritou comigo e disse que não precisavam de estrangeiros e africanos trabalhando lá”.

Em nota, o McDonald’s afirma que o congolês não foi entrevistado pelos recrutadores da empresa, “que preza pelo respeito e cordialidade a toda e qualquer pessoa que deseja trabalhar no McDonald’s”. Também destacou que “está aberta” a contratar estrangeiros desde que “não tenham problemas com documentação”.

A haitiana Carolina Pierre trabalhava em uma empresa de limpeza em São Paulo e foi demitida porque os clientes de alto padrão não gostavam de ser atendidos por uma haitiana negra. “Meu chefe disse que eu era muito escura para a função e que no meu país a gente não é higiênico como aqui”. Meses depois, não foi aceita em um táxi “porque iria sujar o banco do taxi”.

 

Segundo a Secretaria Especial de Direitos Humanos os haitianos são as maiores vítimas de intolerância (26,8%), seguidos por pessoas de origem árabe ou de religião muçulmana (15,45%).

Se dividirmos as denúncias por Estado, temos São Paulo como recordista com 23%, Rio de Janeiro em segundo com 11,2%, seguidos por Minas Gerais 8,9%, Rio Grande do Sul 7,5% e Bahia com 6,39%, os demais estados juntos fazem 37,6%.

Apesar de a quantidade de refugiados no Brasil serem muito menor que em países europeus, os níveis de xenofobia por aqui se igualam com os desses países.

Nosso país foi construído com uma miscigenação muito ampla, colonizadores portugueses, índios nativos da terra, africanos trazidos como escravos, invasores franceses e holandeses. Além disso, várias levas de imigrantes chegaram a nossas terras, como os italianos, japoneses e libaneses, que colaboraram muito com o desenvolvimento do país.

Eu, como filho de pai imigrante libanês e mãe africana, não podia fechar os olhos para a xenofobia cada vez mais acelerada em nosso Brasil. Xenofobia, além de crime é uma desumanidade com seres humanos que fogem de opressões e horrores inimagináveis, em busca de dias melhores, dias de esperança e paz. Vamos dizer não a essa violência.

Por Pedro Ganem